Dom Quixote Volumes I e II - Miguel de Cervantes

 “… o prazer que nasce na alma deve vir da beleza e harmonia que ela vê ou contempla nas coisas que a vista ou a imaginação lhe apresenta, e toda coisa que tem em si fealdade e desarmonia não pode nos causar contentamento algum.”


    O fidalgo Alonso Quixano vivia em uma aldeia da Mancha. Dono de uma renda estável, ele passava seus dias em sua biblioteca particular, lendo seus livros de cavalaria. Já os sabia todos de cor e um dia começou a misturar as histórias dos livros com o mundo real. Decidiu tornar-se cavaleiro andante e sair pelo mundo em busca de aventuras iguais às que lia em seus livros, cheias de batalhas e disputas, donzelas e magos. Então um dia se aprontou com tudo quanto era necessário: uma armadura, armas, um cavalo, uma donzela por quem suspirar de amores, um fiel escudeiro e um nome de cavaleiro Dom Quixote de La Mancha.


    O mundo não é para amadores diriam alguns, nem sonhadores diriam outros. Então quais seriam as chances de a empreitada de Dom Quixote obter sucesso dentro daquilo que ele almejava? (Veja bem, ele não enxergava o mundo exterior como de fato era mas sim como se saídas diretamente de seus livros.) Bem poucas certo? Mas felizmente, para o nosso cavaleiro andante isso não importou muito, tudo o que ele via à sua frente era um mundo perdido e cheio de injustiças a serem reparadas. Seus livros tratavam justamente sobre essa questão e como os cavaleiros resolviam todas essas situações, por isso saiu armado e montado em Rocinante pronto para fazer sua parte. O que tinha tudo para dar errado, acabou dando muito certo apesar das circunstâncias.

    Como previsto, as pessoas que ele encontrou pelo caminho não foram nada gentis, debocharam, pregaram peças, por vezes foram violentos com esse lunático que resolveu sair da ordem vigente e trazer à tona ideais como justiça, lealdade, honestidade, amor, que só se viam mesmo enaltecidos nos romances de cavalaria de épocas passadas. Nem mesmo Sancho Pança, seu escudeiro lhe dava muito crédito. Mas Dom Quixote passa muitos meses(tempo decorrido de suas aventuras nos dois volumes, apesar de o intervalo de publicação entre ambos ser de aproximadamente dez anos), buscando suas aventuras e enfrentando muitos perigos sempre fiel aos ideais de sua alma. Tudo isso faz com que retorne a sua aldeia, como disse Sancho, vencido pelo braço de outra pessoa, mas vencedor de si mesmo, que é a vitória que realmente importa. Mas fica um porém nessa questão: apesar de o personagem ter sido fiel a si mesmo todo o tempo, esse final me deixou triste, e trouxe uma reflexão sobre o que acontece quando somos obrigados a nos inserir em uma realidade que não nos cabe, não ressoa com nossa essência. Inevitavelmente pode acontecer o mesmo que aconteceu com Quixote...

    O humor da história que traz o riso como forma de alerta para nós leitores ao longo de toda a história, não fez muito efeito em mim. Só consegui dar risada em poucas passagens, na maioria das vezes encarei como uma história séria por simplesmente não achar onde estava a graça da coisa toda; certas cenas de covardia não tiveram um efeito muito positivo para mim mesmo considerando o contexto da época. Achei muito interessante no volume dois, o autor colocar os personagens interagindo com o primeiro volume já escrito por ele e com um segundo volume escrito por um autor que se denominou Alonso Fernández de Avellaneda. Cervantes não gostou nada de terem se apropriado de seu personagem, então escreveu o segundo volume e deu um desfecho a Dom Quixote de maneira que mais ninguém conseguiria usá-lo.


    Lançado originalmente em 1605 com o título de O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha, o primeiro volume fez um sucesso enorme, sendo até hoje o segundo livro mais lido no mundo, só perdendo para a Bíblia. O Segundo volume publicado em 1615 também fez sucesso, mas não é tão lido quanto o primeiro. Mesmo que a ideia original do autor tenha sido uma história curta e despretensiosa sobre cavalaria(haja vista as passagens iniciais serem muito curtas, entre elas o tão famoso episódio sobre os moinhos de vento), a coisa foi crescendo e tomando proporções tão grandes que hoje temos um romance enorme que a certa altura fica parecido com As Mil e Uma Noites, uma história se encaixando dentro da outra e por aí vai; mas em algumas passagens ainda acho que o autor poderia ter ido mais direto ao assunto, não precisava enrolar tanto nas falas... Uma das melhores coisas no livro é o prólogo escrito por Miguel de Cervantes de uma ironia muito boa! Ele tira sarro das citações e frases rebuscadas que são normalmente colocadas nos livros dando a entender que são meio inúteis e também zomba um pouco do leitor chamando-o de desocupado logo de cara.

    Recomendo a vocês que conheçam este clássico universal e aconselho a não se deixarem intimidar pelo peso da fama que ele carrega. Leiam com calma e sem expectativas que dá certo; terão comédia, drama, aventura, e muita filosofia. A todos vocês um bom passeio pela Espanha do século XVII.


“… aquele que é louco por força, será louco para sempre, e o que é por escolha deixará de sê-lo quando quiser.”


        Boas Leituras!!




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